6 - O PREPARO DA
PROPRIEDADE ORGÂNICA
Encontrada a janela de produção do
morango orgânico na propriedade e assumindo que o agricultor tenha aptidão para
esse cultivo, o próximo passo é construir as cercas vivas que formam barreiras físicas
na propriedade e têm diversas funções no manejo agroecológico (Figura 3),
assim como fazer a análise do solo e sua correção.
Figura
3 -Vista de uma propriedade com diferentes tipos de cercas vivas (Fonte: Tom
Ribeiro/CATI).
6.1 -
CONSTRUÇÃO DE CERCA VIVA OU QUEBRA VENTO
Onde houver vizinhos
convencionais, a primeira função da cerca viva é
proteger o cultivo orgânico da deriva da aplicação
terrestre de agrotóxicos. Em muitos locais, conseguimos
com sucesso reduzir ou eliminar a área de
sacrifício no cultivo orgânico, ou seja, aquela faixa em
que o cultivo é conduzido dentro dos princípios
orgânicos, mas a fruta é colhida e comercializada como
convencional em razão da presença de vizinhos
convencionais.
Em lugares onde há
pulverização aérea de agrotóxico, a cerca viva por si só não
é eficiente para barrar a deriva desse tipo de
aplicação. Portanto, para garantir a produção orgânica, temos
de aliar uma “faixa de sacrifício” no cultivo.
A função mais conhecida
das cercas vivas é a de quebrar o vento, prova
disso é que são popularmente chamadas de quebra-vento.
Para essa função, a(s) uma aliada no controle de pragas e doenças, caso esteja protegendo todos os lados da
gleba.
Para que o quebra-vento funcione
adequadamente, é fundamental que ele sempre permita a
passagem de um pouco de vento. Em outras palavras,
não deve impedir a passagem de todo o vento.
É importante observar que quando o
quebra-vento impede completamente a passagem do
vento, cria uma zona de menor pressão atrás de si,
fazendo com que o vento provoque sérios danos
no interior da gleba. Vale destacar que uma boa
cerca viva consegue proteger uma faixa de 3 a 10
vezes a sua altura.
Finalmente, ao implantar as cercas
vivas em sua propriedade, com um bom
planejamento, o agricultor pode vir a ter uma poupança
dentro de 10 ou 15 anos, caso considere o
plantio de espécies que possam fornecer madeira, seja para
lenha ou para fins mais nobres (moveleiro).
Nesse caso, não se esqueça de procurar o órgão
ambiental de seu município ou regional para registrar o
plantio e o plano de manejo dessas árvores. Esse
cuidado é fundamental para permitir que no
momento programado, as árvores possam ser
cortadas legalmente.
6.2 -
AMOSTRAGEM, COLETA E ENVIO DE SOLO PARA ANÁLISE QUÍMICA
A análise química do solo
da gleba onde o agricultor irá plantar o morangueiro
orgânico é um passo importante para conhecer a
disponibilidade de nutrientes naturais do
solo e, assim, realizar uma adubação conforme a
necessidade das plantas, evitando o excesso de
adubação, ou pior, a adubação desequilibrada
Para obter uma amostragem correta do
solo na propriedade, o primeiro passo é
identificar suas possíveis diferenças nas glebas, seja
pela cor, seja pelo uso anterior que as áreas tiveram
(cultura anual, pomar, pasto ou pousio). É
importante fazer um croqui da propriedade,
identificando cada uma das glebas.
Em
seguida, o produtor deve escolher uma ferramenta
para fazer a coleta do solo (Figura 4). Pode
ser usado um trado, um enxadão ou até mesmo uma
pá reta (vanga). O importante é limpar o local de
amostragem para evitar que folhas ou gravetos
superficiais sejam encaminhados com a amostra a
ser enviada ao laboratório e que, de cada local
amostrado, seja coletado o mesmovolume de solo.
Figura
4 - Amostragem de solo realizada com um trado
(Fonte: Tom Ribeiro/CATI).
A amostra de solo que será encaminhada
ao laboratório deve ser composta por
várias amostragens de uma mesma gleba (Figura 5). Para
tanto, devemos caminhar em zique-zague pela gleba e
fazer a coleta do solo em cerca de 15 pontos
distintos. O material colhido deve ser colocado em um balde
ou saco plástico limpo.
Concluída a coleta, todo esse material
deve ser levado para um local limpo e coberto.
Recomenda-se que ele seja esparramado sobre um
jornal, em local ventilado,
deixando-o secar por
alguns dias.
Para facilitar a secagem, revolva o solo de
vez em quando e quebre os torrões maiores. O ideal é
peneirá-lo com uma peneira para areia grossa.
Depois de secas e bem misturadas as 15
coletas de uma gleba, identifique um saco
plástico com o nome da propriedade e do proprietário, o
nome ou número da gleba e a data de coleta.
Na
sequência, encaminhe apenas 400 a 500g do solo coletado da
gleba para um laboratório de análise de solo.
O
ideal é pedir uma análise completa, com macro e
micronutrientes.
O resultado deve estar pronto em cerca
de 30 dias.
Ao receber o resultado, consulte um
engenheiro agrônomo que tenha, preferencialmente,
formação em agricultura
orgânica.
Figura
5 - Esquema de caminhada em zique-zague, em duas glebas de uma propriedade, para
coleta de amostras de solo para análise química (Fonte: Tom Ribeiro/CATI).
6.3 - A
CORREÇÃO DO SOLO E A ADUBAÇÃO VERDE
Com o resultado da análise
de solo em mãos, busque a ajuda de um engenheiro agrônomo para que possa interpretá-lo e recomendar
as correções necessárias para o cultivo do morango orgânico.
Se houver a necessidade de
corrigir a acidez do solo, ou acrescentar cálcio e magnésio, essa correção pode ser feita por meio da
calagem, que é a aplicação do calcário no solo, a qual pode ser realizada
manual ou mecanicamente. Note-se que
a dosagem recomendada pelo engenheiro agrônomo é para corrigir a camada superficial de 20 cm de
solo.
O calcário aplicado e incorporado
ao solo irá começar a corrigi-lo mais rápido ou mais lentamente, dependendo da umidade do
solo e do poder de reação do calcário (PRNT - Poder Relativo de Neutralização Total). Em geral,
recomenda-se um intervalo de pelo menos 30 dias entre a aplicação e o plantio
da cultura subsequente.
Após a correção química do solo, o
plantio da adubação verde é altamente recomendado
para o cultivo de morango orgânico, sem
descartar o pousio vegetado com plantas espontâneas
(Figura 6) como uma alternativa econômica para o
agricultor, desde que atendida às necessidades de
correção do local de cultivo para o morango.
Figura
6 - Área em pousio vegetado com plantas espontâneas
para fins de adubação verde. (Fonte: Tom Ribeiro/CATI).
A escolha
da espécie a ser plantada como adubação verde deve
levar em conta a época de cultivo, já
que existem espécies para cultivo nos meses mais frios ou quentes do ano. Devemos
levar em consideração também a presença ou
não de nematoides na gleba em que pretendemos
cultivar o morango orgânico. Também há de se
considerar a necessidade da geração de renda para o
agricultor nessa gleba e a disponibilidade de
sementes dos adubos verdes, mas fundamentalmente
não se esquecer de considerar as exigências
do morango.
O Boletim Técnico CATI nº 249, da
Coordenadoria de Assistência Técnica Integral do governo do Estado de
São Paulo, é a publicação que contém informações
mais atualizadas sobre adubação verde no estado
de São Paulo. Consultar as informações
ali
contidas ajudará o produtor a selecionar a espécie de adubo
verde mais adequada a ser plantada para cada época
do ano.
Ainda
tratando da adubação verde, é importante mencionar
que as crotalárias são plantas que, se manejadas
corretamente, vão disponibilizar no solo uma grande
quantidade de nitrogênio, pois quando se
associam a bactérias capazes de fixar o nitrogênio atmosférico,
disponibilizam até 450 kg de nitrogênio por
hectare ao ano. Se for plantada apenas crotalária
como adubação verde antes do plantio do
morango, poderemos criar condições perfeitas para o excesso de nitrogênio,
resultando em uma planta de
morango desequilibrada nutricionalmente e
suscetível a pragas e doenças. Por isso, é interessante
fazer um consórcio com alguma gramínea,
como milho, milheto ou braquiária.
Deve-se
ressaltar que para ter o desejado manejo da
população de nematoides no solo, o manejo da crotalária
precisa ser correto, ou seja, ela deve ser cortada
ao atingir o máximo florescimento.
6.4- PREPARO DO SOLO PARA O PLANTIO DO MORANGO
6.4.1 - CALAGEM, ROCHAGEM E APLICAÇÃO DE COMPOSTO ORGÂNICO
O
resultado da análise de solo deve ser interpretado com
base agroecológica. Para tanto, o engenheiro agrônomo
deverá utilizar o método de “Equilíbrio de
Bases”, mais precisamente o “Método Albrecht” de
correção da fertilidade dos solos, proposto pelo Prof.
Dr. Willian Albrecht, na década de 1950, então chefe
do Departamento de Solos da Universidade construída
ano a ano, de forma que o cálcio no solo represente
55 a 65% da capacidade de troca de cátion (CTC) do
solo, o magnésio represente de 10 a 15% da CTC, e o
potássio de 3 a 5% da CTC.
Áreas em
que o solo precise de grandes quantidades de
calcário (acima de 2 t/ha), a calagem deve ser previ ta
para o período de conversão da propriedade.
A
aplicação de grande volume de calcário, anualmente,
promove um brusco desequilibro no pH do solo,
além da necessidade de revolvê-lo para a incorporação
do calcário. Isso acaba desfavorecendo o
estabelecimento de microrganismos benéficos no solo, como
o Trichoderma e
Micorrizas, que auxiliam no
controle biológico de doenças do solo e na nutrição
do morangueiro.
Em áreas
onde a fertilidade do solo já esteja equilibrada,
a aplicação de calcário não deve ultrapassar
os 800 kg/ha ano. Até essa quantidade, o cálcio
presente no calcário servirá para estimular a vida
microbiana do solo.
Ainda
considerando o método de “Equilíbrio de Bases”,
devemos ajustar a necessidade de magnésio no solo
porque, quando intensamente cultivado, tende a
ter uma quantidade maior de magnésio do que a
necessária decorrente da aplicação de calcário
dolomítico ao longo de anos.
Portanto, não se esqueça
de verificar e ajustar a concentração de magnésio
em função do “Equilíbrio de Bases”.
O potássio
também é ajustado pelo “Equilíbrio de Bases”,
sendo que uma das formas de adicioná-lo ao solo é
por meio da rochagem. O ideal é aplicar a rocha
potássica antes do plantio do adubo verde.
Vale
comentar que, atualmente, há no mercado rochas
potássicas sendo comercializadas por grandes mineradoras
mas um fator limitante é o valor do frete do
produto, o qual acaba inviabilizando o seu uso quando
a propriedade encontra-se distante da mineradora.
Assim sendo, devemos procurar outras fontes de
potássio no próprio município como, por exemplo,
as cinzas de caldeiras, olarias e até mesmo
de
pizzarias. O importante é que essas cinzas sejam oriundas
de madeira não tratada.
Para o
preparo do solo, também é indicada a que nada mais é do que a aplicação de uma rocha
rica em fósforo, também conhecida por fosfato
natural. No cultivo do morango orgânico, o ideal é
que a concentração de fósforo no solo seja de 60
miligramas por decímetro cúbico (mg/dm3).
Outro
importante ingrediente para a produção do morango
orgânico é o pó de rocha, por ser fonte de todos os
minerais, inclusive dos micronutrientes. Na ausência
dele, procure pela farinha de peixe, outra importante
fonte de micronutrientes, principalmente se for
preparada a partir do pescado marinho.
O composto
orgânico, produzido preferencialmente na composteira
da própria propriedade (Figura 7), deve ser utilizado
como fonte de matéria orgânica e minerais.
Figura 7 -Pilha de compostagem com
resíduos orgânicos (Fonte: Tom Ribeiro/CATI).
Para solos
pobres em matéria orgânica (abaixo de 25 g/dm3)
é imprescindível o uso da adubação
verde. Para solos ricos em matéria orgânica ou quando essa concentração tenha sido
elevada com o manejo de culturas (teor acima de 25 g/dm3), em especial da adubação verde,
deve-se reduzir o uso de fontes ricas em nitrogênio no plantio. Neste caso, o nitrogênio
que o morango necessita será fornecido pela mineralização da matéria orgânica do solo e
suplementado, conforme a necessidade, por meio da adubação de cobertura com Bokashi
(Tabela 2), farelo de mamona ou outra fonte orgânica de nitrogênio.
TABELA 2. INGREDIENTES UTILIZADOS E RESPECTIVAS QUANTIDADES PARA O PREPARO DE BOKASHI AERÓBICO PELA UNIDADE DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM AGRICULTURA
Modo de
preparo: Esquente em uma vasilha aproximadamente
metade da água (8 l) para preparar o
mingau. Quando estiver fervendo, acrescente
0,5 kg de uma fonte de amido (pode ser
farinha de mandioca ou milho) e deixe
cozinhar por alguns minutos. Retire a vasilha
do fogo e deixe esfriar. Enquanto esfria o
mingau, em um local coberto, misture os
demais ingredientes. Depois de misturar
os ingredientes, esparrame o monte.
Quando o
mingau estiver frio, acrescente o melaço ou
açúcar mascavo, mexa e adicione o restante
da água. Na sequência, coloque o mingau no
monte esparramado e, aos poucos, misture
tudo várias vezes. Por fim, peneire essa
mistura para quebrar qualquer bola de umidade.
Amontoe novamente e não deixe a temperatura
no monte ultrapassar 60 a 65oC.
Em
aproximadamente uma semana, o Bokashi aeróbico
estará pronto para uso.
O composto
orgânico e o Bokashi são importantes
na recolonização do solo pelos microrganismos
benéficos.
Com o
intuito de obter um solo equilibrado para o cultivo de morango orgânico, a
concentração de
micronutrientes
(Tabela 3) disponível no solo deve ser de:
TABELA 3 - CONCENTRAÇÃO DE MICRONUTRIENTES NO SOLO PARA O PLANTIO DE MORANGO ORGÂNICO
Para
conhecer as características do solo de sua propriedade e saber o quanto de cada nutriente
é necessário acrescentar para manter o solo equilibrado, a análise química do
solo dos macro
e micronutrientes é fundamental.
A análise
foliar é uma ferramenta interessante para o monitoramento da nutrição do morangueiro,
desde que as escalas utilizadas estejam calibradas para o cultivo agroecológico e para a
cultivar que foi plantada.
Para saber
quais fontes de fertilizantes são permitidas na agricultura orgânica, consulte o Anexo
III da IN Mapa 17/2014 (www.agricultura.gov.br/arq_editor/IN-17.pdf) ou o Regulamento
Técnico para Sistemas Orgânicos de Produção que estiver em vigor.
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