domingo, 12 de novembro de 2017

Produção de mudas de Caju


No Brasil, a produção de mudas de cajueiro é regida pelas “Normas e padrões específicos para a produção e comercialização de mudas de cajueiro” (BRASIL, 2006). Essas normas estabelecem as exigências para a produção, comercialização e utilização das mudas de cajueiro, visando garantir sua identidade e qualidade física e fitossanitária.
Os viveiros de produção de mudas de cajueiro devem ser identificados com uma placa contendo o nome ou razão social, o número do Registro Nacional de Sementes e Mudas (Renasem) e a identificação do responsável técnico. O viveiro deve estar a uma distância mínima de 50 m de qualquer planta adulta de cajueiro e, no mínimo, 20 m de estradas públicas. O solo da área do viveiro deve apresentar boas condições de drenagem e não apresentar histórico de problemas fitossanitários.
O cajueiro pode ser propagado tanto pela via sexual (sementes) ou assexual (propágulos). As plantas oriundas de sementes são popularmente chamadas de “pé-franco” e tecnicamente, de “mudas seminais” ou “seedlings”. Devido ao fato de o cajueiro apresentar polinização cruzada (entre indivíduos diferentes), suas sementes são geneticamente diferentes, originando, assim, plantas diferentes. Por isso, se essas mudas seminais forem utilizadas para o plantio no campo, o resultado será pomares com alta taxa de heterogeneidade, os quais apresentarão plantas com copas irregulares, folhas, castanhas e pedúnculos com tamanhos, formatos e cores diferentes; características indesejáveis agronomicamente.
Assim, na exploração comercial da cultura, as mudas de cajueiro devem ser produzidas por meio da enxertia de garfos ou borbulhas oriundos de plantas com características genéticas superiores, em porta-enxertos previamente produzidos. A técnica da enxertia permite a obtenção de plantas (copas) geneticamente idênticas (clone) à planta-mãe. Como a Embrapa gerou diversos genótipos superiores de cajueiro, a disponibilização desses materiais somente pode ser realizada pelo processo de clonagem, sendo os principais métodos de enxertia a garfagem em fenda lateral e a borbulhia em placa.

Sementes e propágulos vegetativos

As sementes (castanhas) utilizadas para a formação do porta-enxerto devem ser oriundas de plantas cultivadas em um pomar específico, denominado jardim de sementes, o qual deverá estar inscrito em um órgão oficial de fiscalização. As plantas do jardim de sementes devem apresentar aspectos fitossanitário e nutricional adequados e apresentarem as características peculiares do genótipo (clone) em questão.
Do mesmo modo, as plantas matrizes fornecedoras de garfos e borbulhas deverão fazer parte de um pomar específico, chamado jardim clonal (Figura 1), devendo, também, estar inscrito num órgão oficial de fiscalização.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 1. Campo de matrizes (jardim clonal) dos clones de cajueiro da Embrapa, em Pacajus, CE. As plantas são podadas (acima), adubadas e irrigadas; e a partir dos 90 dias após a poda (abaixo) elas já fornecem propágulos (garfos) para a enxertia.
As plantas fornecedoras de material de propagação (sementes e propágulos), devem pertencer a uma cultivar (clone) inscrita no Registro Nacional de Cultivares (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Atualmente, encontram-se registrados os seguintes clones de cajueiro: ‘BRS 189’, ‘BRS 226’, ‘BRS 253’, ‘BRS 265’, ‘BRS 274’, ‘BRS 275’, ‘CCP 06’, ‘CCP 09’, ‘CCP 76’, ‘CCP 1001’, ‘EMBRAPA 50’, ‘EMBRAPA 51’, ‘FAGA 01’ e ‘FAGA 11’.
Quanto à produtividade, uma planta matriz de cajueiro, em condições irrigadas e a partir do terceiro ano de idade, pode fornecer até 700 borbulhas ou garfos por ano.

Produção do porta-enxerto

O porta-enxerto pode ser produzido em sementeira ou em recipientes específicos, sendo esse último o mais recomendável. Os recipientes mais utilizados pelos produtores de mudas de cajueiro são o saco plástico preto (26 cm a 28 cm de altura e 13 cm a 15 cm de largura) e o tubete plástico de 288 mL, sendo este recomendado para quando as mudas precisarem ser transportadas a longas distâncias.
Os recipientes são dispostos em canteiros sob viveiro telado ou a pleno sol, e normalmente são preenchidos com substrato composto pela mistura de casca de arroz carbonizada, solo hidromórfico peneirado (malha de 6 mm) e bagana de carnaúba na proporção volumétrica de 2:1:1. Substratos comerciais à base de casca de pínus moída e vermiculita também podem ser utilizados. Recomenda-se a realização prévia da análise química do substrato objetivando-se verificar a necessidade de adubação e o valor do pH, que deve ser entre 5,5 e 7,0.
Atualmente, o porta-enxerto mais avaliado e recomendado é o clone de cajueiro-anão ‘CCP 06’, pois apresenta elevadas taxas de germinação e de plântulas normais, além de melhor pegamento de enxertia (compatibilidade) com os outros clones da Embrapa. O clone de cajueiro-anão ‘CCP 76’ também é muito utilizado como porta-enxerto, devido, principalmente, à sua maior disponibilidade nas regiões produtoras, embora seja suscetível à doença da resinose.
A semeadura é realizada colocando-se uma semente por recipiente, na posição vertical – com a ponta mais fina para baixo e a cicatriz da inserção do pedúnculo para cima. A profundidade da semeadura não deve ultrapassar 3 cm, sendo mais comum deixar a base da semente rente ao nível do substrato. Após a semeadura, os canteiros deverão ser cobertos com sombrite, sacos de juta ou algo similar, com o intuito de preservar a umidade do substrato após as irrigações (Figura 2).
A germinação inicia-se já na primeira semana após a semeadura; contudo, grande parte ocorre entre o 12º e o 20º dia (Figura 3). A partir daí, recomenda-se o replantio daquelas que não germinaram. Normalmente, quando se utilizam castanhas novas e de boa qualidade do clone ‘CCP 06’, obtêm-se taxas de germinação superiores a 90%. Castanhas de maiores comprimento e espessura tendem a apresentar menores taxas de germinação.
Quando as plantas do porta-enxerto de cajueiro atingirem valores próximos a 0,45 cm de diâmetro do caule no ponto de enxertia (≈ 6 cm a partir do colo), 25 cm de altura e 10 folhas, elas estarão aptas à enxertia (Figura 4). Geralmente os porta-enxertos se apresentam aptos à enxertia entre 45 e 75 dias após a semeadura, com variação de acordo com a época do ano e das condições de produção (como ambiente, embalagem e substrato). As plantas que não apresentarem vigor suficiente e estiverem deformadas, cloróticas (folhas amareladas), com superbrotamento ou raquíticas deverão ser eliminadas.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 2. Etapas iniciais da produção de porta-enxertos de cajueiro: abertura das covas (A) semeadura (B), proteção do canteiro com sombrite (C) e irrigação (D).
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 3. Início da germinação das sementes de cajueiro a partir do 7º dia da semeadura (A) e plântulas entre 10 e 15 dias da semeadura (B). Os porta-enxertos podem ser produzidos sob viveiro telado (C) ou a pleno sol (D).
Foto: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 4. Porta-enxertos de cajueiro aptos à enxertia, aos 60 dias após a semeadura. As plantas desta foto apresentaram médias de 35 cm de altura, 0,52 cm de diâmetro de caule (no ponto de enxertia) e 11 folhas.

Processos de enxertia

1. Enxertia por garfagem em fenda lateral
Os garfos para o processo de enxertia são obtidos de ramos vegetativos das plantas pertencentes a um jardim clonal. Os ramos devem ter consistência herbácea a semilenhosa, apresentar gema apical intumescida (pronta pra brotar) e folhas terminais maduras (Figura 5). Os garfos são cortados com 15 cm a 20 cm de comprimento e desfolhados logo em seguida, sendo acondicionados em sacolas plásticas ou em panos úmidos para diminuir a perda de umidade. É extremamente importante que os garfos possuam diâmetro compatível com o diâmetro do caule do porta-enxerto, entre 0,45 cm e 0,60 cm.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 5. Seleção de uma ramo vegetativo na planta matriz de cajueiro (A), corte do garfo e desfolha (B), acondicionamento dos garfos em sacola plástica (C) e garfos prontos para serem enxertados (D).
Uma vez obtidos os garfos, inicia-se o processo da enxertia, sendo o primeiro procedimento o corte da parte aérea do porta-enxerto, deixando-o com apenas quatro folhas. Em seguida, no caule do porta-enxerto, a aproximadamente 6 cm do colo, efetua-se, de cima para baixo, uma incisão oblíqua de até 2,5 cm (Figura 6A).
Logo após a realização da incisão no caule do porta-enxerto, seleciona-se um garfo e corta-o em sua base (Figura 6B). O local do corte no garfo é onde haja um diâmetro semelhante ao do caule do porta-enxerto. O corte na base do garfo é do tipo bisel duplo formando uma cunha de aproximadamente 2,5 cm de comprimento (semelhante à incisão feita no caule do porta-enxerto), e, geralmente, o garfo fica com 8 cm a 10 cm de comprimento. Faz-se então a junção do garfo na incisão do porta-enxerto (Figura 6C) e o amarrio de uma fita plástica em espiral, de baixo pra cima, no local da enxertia, mantendo-se firme o contato entre as partes unidas (Figuras 6D e 6E). Por fim, realiza-se a cobertura do garfo com um saquinho plástico transparente (Figura 6F), o qual é amarrado na base, para evitar a contaminação dos tecidos cortados e o ressecamento do enxerto.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 6. Enxertia por garfagem lateral em cajueiro: incisão oblíqua no caule do porta-enxerto (A), corte da base do garfo (B), enxertia do garfo (C), amarrio do enxerto (D, E) e proteção do enxerto com saquinho plástico (F).
Após a realização da enxertia por garfagem lateral (Figura 7A), as mudas deverão ser mantidas em viveiro telado (Sombrite® 50%) (Figura 7B), por 25 a 30 dias, época em que os garfos enxertados iniciam a emissão das novas folhas (Figura 8). Nessa época, os saquinhos de proteção dos garfos deverão ser retirados e o resto da parte aérea do porta-enxerto é cortada.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 7. Mudas de cajueiro recém-enxertadas mantidas sob viveiro telado.

Foto: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 8. Muda de cajueiro apresentando brotação do enxerto.
Após a expansão total das primeiras folhas recém-surgidas no enxerto (Figura 9A), entre 40 e 50 dias da enxertia, as mudas são levadas para canteiros a pleno sol para aclimatação (Figura 9B). Nessa fase, a fita plástica utilizada para o amarrio do garfo no porta-enxerto deve ser retirada.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 9. Mudas de cajueiro com as primeiras folhas expandidas (A) devendo ser levadas para os canteiros de aclimatação a pleno sol (B).
Entre 60 e 90 dias após a enxertia, as mudas de cajueiro estarão aptas ao plantio no campo, apresentando altura mínima de 20 cm e com pelo menos seis folhas totalmente expandidas (Figura 10).
Foto: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 10. Muda de cajueiro apta a ser plantada no campo.
2. Enxertia por borbulhia em placa
As borbulhas são placas com lenho na forma elíptica com 1,5 cm a 2,0 cm de comprimento. São obtidas de ramos produtivos em pleno florescimento, com cerca de 50% a 70% de flores abertas e com pelo menos quatro gemas laterais intumescidas (Figura 11A). Logo após a coleta, os ramos deverão ser levados para o local da enxertia, onde serão desfolhados (Figura 11B) e preparados para a retirada das borbulhas (Figura 11C). É importante ressaltar que a enxertia por borbulhia pode ser feita tanto em locais sombreados como a pleno sol; por isso, é esse o tipo de enxertia realizado no processo de substituição de copas, em plantas adultas.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 11. Ramo reprodutivo do cajueiro em plena floração (A). O ramo deve ser desfolhado e a panícula é retirada (B), deixando-o pronto para a extração das borbulhas intumescidas (C).
O processo de enxertia por borbulhia inicia-se com a realização de um corte, do tipo placa, no caule do porta-enxerto, a aproximadamente 6 cm do colo. Logo em seguida retira-se a borbulha (gema) do ramo fornecedor (Figura 12A) e realiza-se a justaposição dela no corte feito no caule do porta-enxerto (Figura 12B). Por fim, as partes são amarradas com fita plástica, em espiral de baixo para cima (Figura 12C). É importante frisar que o corte feito no caule do porta-enxerto deverá ser do mesmo tamanho da borbulha.
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 12. Borbulha retirada do ramo reprodutivo de cajueiro (A) e justaposta no caule do porta-enxerto (B). Em seguida faz-se o amarrio da borbulha (C).
Após o amarrio, realiza-se a proteção da borbulha contra a radiação solar utilizando-se uma folha do próprio porta-enxerto (Figura 13A). Nesse tipo de enxertia, pelo fato de a borbulha ser de menor tamanho, fácil de ser protegida, e pela justaposição ser mais precisa entre os tecidos, as mudas recém-enxertadas poderão ficar tanto sob viveiro telado quanto a pleno sol. Semelhante ao processo anterior (garfagem), as mudas enxertadas por borbulhia estarão aptas ao plantio no campo entre 60 e 90 dias após a enxertia (Figura 13B).
Fotos: Luiz Augusto Lopes Serrano
Figura 13. Borbulha protegida após a enxertia (A) e muda de cajueiro apta ao plantio no campo (B).
Em ambos os métodos de enxertia, observa-se, no geral, uma taxa de pegamento da enxertia entre 70% e 90%, dependendo da época do ano e da combinação entre os genótipos de cajueiros utilizados como porta-enxerto e copa. É válido lembrar que, quanto menor for o período entre a obtenção dos propágulos (garfos e borbulhas) e a realização da enxertia, maior será a taxa de pegamento.
No geral, considera-se que as mudas de cajueiro aptas ao plantio no campo devam apresentar entre 120 e 180 dias de idade (a partir da semeadura). Elas devem apresentar ponto de enxertia cicatrizado, aspecto vigoroso, com no mínimo 6 folhas maduras e 20 cm de altura.


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